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Íntegra do texto publicado no Portal länk

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Em um cenário de crise econômica, envelhecimento populacional e demanda crescente pelos serviços, faz-se necessário implementar mudanças que tornem o sistema de saúde mais sustentável. Recentemente, o  Instituto Coalização Saúde (ICOS) – organização que reúne representantes da cadeia produtiva do setor, para o debate e a busca de novas soluções – lançou o livro Coalizão Saúde Brasil: uma agenda para transformar o sistema de saúde. O livro aponta os principais fatores de pressão e sugere iniciativas que unem os setores público e privado. Em entrevista ao Portal länk, Denise Eloi, CEO do ICOS, fala sobre algumas propostas da instituição para impulsionar o desenvolvimento da saúde no país.

A carência de ações de promoção e prevenção está elencada entre as forças que pressionam o sistema de saúde brasileiro e comprometem sua sustentabilidade. Saúde não é apenas um dever do Estado, mas uma responsabilidade do indivíduo. De forma prática, como os cidadãos podem ser capacitados para exercer um papel mais ativo e responsável no cuidado com a própria saúde?

Primeiramente, é importante destacar que se trata de uma mudança de cultura, que envolve o empenho de toda a sociedade, não apenas uma iniciativa individual do cidadão. Além do acesso à informação sobre promoção de saúde, é necessário que o cidadão compreenda a importância do cuidado por si mesmo, com estímulos que podem ser apreendidos, por exemplo, desde a escola, no ambiente familiar e, também, nas organizações e empresas, onde os adultos passam a maior parte do seu tempo.

Considerando que o Brasil é um país de acentuada desigualdade regional e econômica, em que espaços essa educação para o autocuidado se daria? Em quais aspectos o país já caminha bem nesse sentido, e quais ações podem ser amplificadas?

Sem dúvida, a escola é um ambiente-chave nessa mudança, além de espaços no ambiente corporativo etc. No Brasil, houve uma evolução positiva em alguns fatores de risco, como a diminuição significativa de fumantes nos últimos anos, o aumento do consumo regular de vegetais por parte da população e maior adesão à prática de exercícios. No entanto, apesar dessas mudanças positivas, a população ainda está exposta a fatores de risco preocupantes como o consumo excessivo de álcool, crescimento do número de adultos com hipertensão e o aumento exponencial da obesidade.

A falta de ações de promoção também pode ser creditada à configuração do sistema de saúde, que foca mais em doenças do que na prevenção e confere ênfase excessiva ao modelo de atenção hospitalar. Quais são as propostas do Instituto para estabelecer um novo modelo de atenção?

Enfrentar o desafio de desenvolver um novo modelo de atenção é um dos objetivos do ICOS. Para tanto, é consenso de que as mudanças para serem efetivas devem ser estruturantes e não compensatórias. No estudo que publicamos, apontamos uma jornada para os próximos anos com ações de curto, médio e longo prazo. O mundo tem evoluído para sistemas com foco na promoção da saúde e prevenção de doenças com objetivos que visem a melhoria da saúde da população, maior satisfação dos cidadãos e a sustentabilidade financeira do sistema. Pela primeira vez, estamos todos reunidos e engajados em apontar os caminhos para reestruturarmos, de uma maneira mais inteligente, sustentável e, principalmente, humana, o setor da saúde do nosso país.

O acesso facilitado às informações e o protocolo universal são outras medidas essenciais para estimular o desenvolvimento da saúde. No Brasil, o setor está preparado para o “choque de transparência” que tais medidas exigem? Afinal, por aqui não raro impera um modelo de atuação compartimentado, com pouca integração entre diferentes instituições?

O nosso país tem passado por importantes mudanças nos últimos anos e os brasileiros exigem cada vez mais transparência, especialmente naqueles setores estratégicos para a sociedade; e a saúde está entre os primeiros em ordem de importância. Portanto, o ICOS surge com o propósito de integrar esses diferentes players do setor, visando reunir o máximo de conhecimento e experiência, articulando toda a cadeia produtiva, em nome dos melhores interesses público e privado.

A melhor integração público-privada está entre as propostas apresentadas pelo Instituto para atacar os desafios do setor…

O SUS é composto não apenas pelo sistema público, mas também pelo sistema privado; e este tem o papel de ajudar o sistema público a prover serviços de saúde.
O estudo que realizamos mostra que no Brasil existe espaço para uma maior participação do setor privado no intuito de reduzir a carga do público, como ocorre em outros sistemas de referência.

Por terem menos restrições, as experiências internacionais apontam que, em geral, o setor privado torna-se de 20% a 30% mais eficiente que o gerenciado pelo setor público. Portanto, deduz-se que para melhorar a governança atual do sistema de saúde brasileiro, os elos da cadeia devem aproveitar oportunidades de sinergias com uma maior cooperação entre público e privado.

Para além das medidas práticas, as novas possibilidades mencionadas acima exigem uma grande mudança do “mindset” dos profissionais de saúde, que terão de pensar o segmento de outra maneira, não? Quais os principais “entraves mentais”, e quais podem ser possíveis caminhos para contorná-los?

Para enfrentarmos um problema de enorme complexidade, com uma incontável multiplicidade de causas e atores, sujeitos e consequências, precisamos promover mudanças que envolvam a quebra de paradigmas por parte de todos os integrantes da cadeia produtiva, não apenas dos profissionais de saúde. Entendemos que apenas com a união coordenada dos setores público e privado, será possível avançar na construção de um sistema de saúde sustentável. Acreditamos que o trabalho desenvolvido pelo ICOS é o início de uma necessária e bem-vinda transformação do sistema de saúde do Brasil.